namastê https://namaste.blogfolha.uol.com.br Vida de ioga no tapetinho e fora dele Wed, 19 Jun 2019 10:00:46 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Sobre a lei da impermanência e despedida deste blog https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/06/19/sobre-a-lei-da-impermanencia-e-despedida-deste-blog/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/06/19/sobre-a-lei-da-impermanencia-e-despedida-deste-blog/#respond Wed, 19 Jun 2019 10:00:46 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2019/06/IMG_20180315_095234159_HDR-320x213.jpg https://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=677 Se podemos ter uma certeza neste mundo, é a da impermanência: da matéria, do corpo, da mente, das nossas relações e interações, do que fazemos, do que observamos à nossa volta, de quem observamos à nossa volta.

A vida é constante transformação e, apesar de não termos dúvida disso, quantas vezes nos surpreendemos, seja com o corpo que envelhece, com os sentimentos que passam, com as pessoas que se vão ou com as que permanecem, mas “já não são mais as mesmas”.

É justamente a impermanência que permite o frescor da renovação. Mas uma mente distraída, oscilante ou pesada nos impede de reconhecer e aceitar o movimento natural da vida. E assim geramos apegos ao passado e expectativas para o futuro, causas de frustrações que tiram nossa tranquilidade, o tão almejado estado de equilíbrio.

Aqui, mais uma vez, ioga é ferramenta, como aprendi com minha professora Ana Poubel. A prática nos ajuda no processo de sensibilização e abertura para que possamos seguir com leveza a fluidez da vida, renovando-nos a cada instante: sempre um novo sujeito diante de uma nova realidade. Como também ensina meu professor Diego Koury, no livro “Pedagogia para uma Nova Mente”:

“A travessia, na perspectiva do Yoga, é a contínua experiência de aprendizado e abandono. Independente dos acontecimentos e das cargas por eles geradas, há sempre a possibilidade de aprendizado e de dissolução das cargas vividas nas experiências. Mas tal liberdade não ocorre ao acaso. A mente precisa se renovar na mesma velocidade em que o presente evolui. Quanto maior for a disponibilidade e equanimidade da mente, maior a possibilidade de experiência real e de sentimentos genuínos. Esse processo de renovação mental, ou de purificação do conteúdo mental, é crucial para que o indivíduo transforme a perspectiva que construiu sobre a vida e para que o movimento natural de constante transformação da vida deixe de ser aflitivo. Esse empenho é o Yoga, assim como o objetivo da prática.”

Dito isso, informo que este blog será encerrado no site da Folha. Agradeço profundamente aos leitores que nos acompanharam, aos meus professores e alunos que tanto me ensinam e me inspiram a compartilhar aprendizados, aos colegas pelas parcerias e ao universo por todas as experiências.

Quem quiser receber por e-mail ou WhatsApp meus próximos textos, novidades, sugestões de leitura, eventos, cursos, retiros e outras dicas relacionadas a ioga e meditação pode se inscrever neste link. Para outras informações, dúvidas, sugestões ou convites, é possível me encontrar no Instagram @patriciabritto.yoga e no Facebook/patriciabritto.yoga.

Boas práticas para todos nós!

Namastê _/|\_

 

 

 

 

 

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Conversas de iogue: o que tem por trás dessa filosofia? https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/03/31/conversas-de-iogue-o-que-tem-por-tras-dessa-filosofia/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/03/31/conversas-de-iogue-o-que-tem-por-tras-dessa-filosofia/#respond Sun, 31 Mar 2019 18:06:48 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2019/03/patanjali-320x213.jpg https://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=606 Um dia você decidiu experimentar. Depois de aquele amigo zen tanto insistir, o analista recomendar e você sempre responder que não tem paciência pra essas coisas muito paradas, um dia você passou por acaso na frente de um estúdio e decidiu se matricular em uma aula de Ioga. Só pra ver como é…

Pode ser que, de cara, você tenha conseguido se desligar das suas inquietações e vivido uma experiência interessante. Talvez tenha se sentido mais relaxado e quem sabe até tenha passado o resto do dia mais disposto, com bom humor. Ou pode ser que você tenha se sentido incomodado, impaciente e desconfiado, mas escolheu continuar, afinal não é de uma hora pra outra que as coisas fazem efeito.

Curioso ou desconfiado, você começa a conviver com pessoas que têm umas conversas estranhas. Gratidão pra cá, desapego pra lá, não violência, amor, viver o presente, silenciar a mente, energia vital, essência do ser, transformação, entrega para o universo e confia… “Essas pessoas não se dão conta de que estão sendo ingênuas, alienadas ou acomodadas?”, você se pergunta.

“Não posso silenciar minha mente se tenho uma questão importante para solucionar.” “Preciso reagir à altura quando erram comigo para deixar bem claro quem eu sou.” “Desapego, tipo indiferença?” “Como não me preocupar com o futuro que não está garantido ou com o passado que me marcou?” “Tantos problemas no mundo e vocês aí falando em gratidão e contentamento?”

“Esse papo de autoconhecimento parece autoajuda, assunto para pessoas inseguras.” “O mundo hoje em dia é muito competitivo, é preciso ser forte, não há espaço para humildade.” “Não preciso transformar nada.” Então você decide ignorar a parte filosófica, mas segue nas aulas porque, de alguma forma, aquilo está sendo útil. Sempre tem algo que se pode aproveitar…

Seu contato com ioga pode ter começado com diferentes graus de desconfiança ou curiosidade, mas é improvável que você tenha passado indiferente a esse jeito de viver e de se posicionar. Por isso, para quem ficou interessado em entender os fundamentos dessa filosofia, eu recomendo conhecer os “Ioga Sutras” de Patanjali.

A EXPERIÊNCIA DA MENTE

Considerado um texto clássico sobre a prática e a filosofa da ioga, o “Ioga Sutra” foi escrito por Patanjali, um sábio que viveu na Índia em algum período entre 200 a.C e 400 d.C. Ele não foi o criador dessas ideias, mas compilou o conhecimento que existia na época de forma dispersa para que pudesse ser transmitido de forma sistematizada.

Como o ensino se baseava na tradição oral, o texto de Patanjali foi escrito na forma de sutras, ou aforismos, que condensaram várias camadas de informações de forma enxuta para que pudessem ser facilmente decorados e transmitidos oralmente de mestre a discípulo. Daí surgiu a tradição de recitar os sutras e de estudar os comentadores que ajudam a interpretar os sentidos por trás do texto conciso.

E o que dizem esses aforismos? Tratam sobre o caminho da ioga de busca da compreensão da realidade –sobre nós e o universo– por meio do estudo da mente humana: como ela se relaciona com nossas escolhas, ações, sentimentos, padrões de comportamento e como podemos usá-la a nosso favor. Isso só pra começar…

Então, ao compreendermos melhor as possibilidades da mente, começam a fazer sentido aquelas frases que costumamos ouvir nas aulas de ioga. Uma nova janela de possibilidades se abre, como afirma Swami Vivekananda no livro “Raja-Yoga: o caminho da meditação”:

“[A Raja Yoga] declara que cada pessoa é apenas um canal para um infinito oceano de conhecimento e de energia existente por trás da humanidade. Ensina que os desejos e as necessidades estão no homem, que o poder de satisfazê-los também está no homem; e que não importa quando nem onde um desejo, uma necessidade ou uma prece tenha sido atendida, foi daquele infinito manancial que a provisão se originou, e não de algum ser sobrenatural.”

Mas tem um detalhe importante. A investigação da mente proposta nos sutras não se restringe ao estudo intelectual. Como explica Vivekananda, é preciso ir além do instinto (inconsciente) e da razão (consciente) para se compreender o estado transcendente ou supraconsciente da mente humana.

E isso só é possível por meio da experiência, base de todo o conhecimento, segundo o autor. “A experiência é o único mestre que temos. Podemos falar e refletir por toda a vida, mas não compreenderemos uma única palavra da verdade até que nós mesmos a tenhamos vivenciado.”

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Por que queremos mudar ou todo dia pode ser segunda-feira https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/01/11/por-que-queremos-mudar-ou-todo-dia-pode-ser-segunda-feira/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2019/01/11/por-que-queremos-mudar-ou-todo-dia-pode-ser-segunda-feira/#respond Fri, 11 Jan 2019 13:37:49 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2019/01/Fogueira-de-Ano-Novo-150x150.jpg https://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=516 Desde que eu pedi demissão do meu emprego como editora de política de um dos principais telejornais do país, dois anos atrás, não paro de receber comentários e olhares curiosos, com uma mistura de surpresa, admiração e confissão de desejos secretos de amigos, alunos e leitores que também querem fazer alguma mudança de vida.

Cada pessoa é o melhor oráculo de si mesma para saber o que fazer com base em sua história, suas aptidões, seus desejos, sua intuição. Mas como os pedidos continuam, aproveito o clima de resoluções de Ano Novo para compartilhar algumas impressões pessoais, baseadas na minha experiência e nos meus estudos de ioga. Só não se esqueçam de que não existe caminho único que sirva para todos.

Muitas vezes, a vontade de mudança surge quando sentimos que falta algo para nos considerarmos completamente satisfeitos. Mas, se essa for nossa única motivação, podemos estar nos iludindo. Enquanto estivermos buscando o sentido da vida ou preenchimento de um vazio em fontes externas, como no trabalho, nos relacionamentos ou em atividades que nos dão prazer, estaremos suscetíveis a frustrações. Mesmo que consigamos conquistar tudo que achamos essencial para nos fazer felizes, em algum momento essa “condição ideal” deixará de existir, já que nada é permanente, nem mesmo nossa opinião sobre o que seria uma “condição ideal”. E o resultado é que corremos o risco de passar o resto da vida em buscas intermináveis.

Os textos clássicos de ioga dizem que a capacidade de nos sentirmos plenamente satisfeitos não depende de fatores externos e já existe em cada um de nós. O problema é que, muitas vezes, não conseguimos sentir isso nem acreditar que é possível, pois vivemos em meio a tantas preocupações e distrações (chamadas em ioga de “vrittis”, ou ondas mentais) que deixamos de olhar pra nós mesmos, de nos entender e de conhecer nossas possibilidades. Então, para muitas pessoas, mudanças no estilo de vida são úteis, sim. Não porque elas em si nos farão felizes, mas porque podem nos dar a oportunidade de nos conectarmos com nós mesmos, para que possamos realmente viver a experiência de nos sentirmos completos com o que já temos e do jeito que já somos. Como diz a canção do Gilberto Gil, precisamos “aprender a só ser”.

Quais mudanças ajudariam a reduzir os obstáculos que nos impedem de nos conectarmos com nós mesmos? Depende da pessoa, mas são as que nos permitem acalmar as tais ondas mentais. Para uns, pode ser importante dedicar mais cuidado à saúde, tranquilizar a mente e compreender suas emoções –porque um corpo frágil, uma mente inquieta e um coração angustiado nos impedem de nos concentrarmos na nossa essência. Para outros, o contato com a natureza ajuda a perceber outros níveis de valores, além dos materiais. Ou ainda a convivência com pessoas e ambientes que inspirem mais sentimentos de gratidão, desprendimento, colaboração e compaixão, e menos de individualismo, apego, competição e violência.

Nem sempre essas mudanças dependem de uma reviravolta na nossa vida. Nem todo mundo precisa pedir demissão, terminar relacionamentos, vender seus bens, dar uma volta ao mundo ou ir morar na Chapada Diamantina. Cada caso é um caso e a jornada do autoconhecimento vem acompanhada da observação das suas necessidades individuais, da responsabilidade pelas suas escolhas, assim como de respeito ao tempo do seu próprio processo. Dito isso, cuidado para não cair na sua armadilha.

É fácil nos ancorarmos em fatores que não controlamos, como falta de tempo ou de dinheiro, como justificativa para não tomarmos atitudes que desejamos. Mas a mudança pode acontecer em etapas, e talvez algumas delas já estejam ao seu alcance. Adiar a decisão para o momento em que todas as condições estiverem favoráveis pode ser só uma forma de nos consolarmos pela nossa falta de ação. Então, aos que me contam que querem uma mudança, eu digo para não esperarem passar o Carnaval ou chegar o próximo Ano Novo. Cada momento já pode ser o ideal para mais um passo da sua transição. Todo dia pode ser uma segunda-feira.

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Qual caminho de ioga mais combina com você? Entenda as diferenças https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/09/14/qual-caminho-de-ioga-mais-combina-com-voce-entenda-as-diferencas/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/09/14/qual-caminho-de-ioga-mais-combina-com-voce-entenda-as-diferencas/#respond Fri, 14 Sep 2018 10:30:20 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2018/09/Tao-Porchon-Lynch-150x150.jpg https://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=316 Entender quem somos, de onde viemos e por que estamos aqui é uma das curiosidades que move o ser humano desde os tempos mais antigos de que se tem notícia. Se temos capacidade de refletir, não nos contentamos em simplesmente viver. Queremos saber mais.

Motivados por esse mistério, encontramos as mais variadas explicações, desenvolvemos ciências, seguimos religiões, estudamos filosofias, falamos em acasos, nomeamos deuses, consultamos astrólogos ou procuramos qualquer outra resposta aparentemente além da nossa compreensão.

A mesma busca por entender a realidade sobre nós mesmos e o mundo a nossa volta é também um dos objetivos da ioga. Os textos clássicos dessa filosofia dizem que esse entendimento já existe em cada um nós, mas que para podermos percebê-lo precisamos transcender nossas limitações físicas, mentais e emocionais.

Vários caminhos foram descritos para se chegar à desejada verdade por meio da ioga. Todos eles se propõem, cada um do seu modo, a afastar os obstáculos que nos impedem de ver nossa essência real.

Por que diferentes caminhos? Porque temos diferentes personalidades, inclinações e preferências. Uns só veem sentido na razão; outros se sentem bem em expressar uma fé; tem aqueles mais contemplativos; ou ainda os que se realizam pela ação, para dar só alguns exemplos.

A ideia é que, se todos os caminhos levam ao mesmo destino, cada um pode escolher o que faz mais sentido pra si. Apesar de serem usados conceitos diferentes, não tem um mais certo que o outro. No fim das contas, os caminhos se complementam e, às vezes, até se misturam.

Conheça abaixo alguns dos principais caminhos de ioga:

JÑANA IOGA
Conhecido como ioga do conhecimento, da razão ou da intuição. Busca distinguir o real do irreal por meio do intelecto. Para essa escola, não existe um deus separado dos homens. Baseia-se na metafísica não dualista, enxergando todos os seres como parte de uma mesma consciência universal, única e impessoal, e usa como método para chegar a essa compreensão o estudo de textos tradicionais e o auto-questionamento sobre a natureza do ser.

KARMA IOGA
Também chamado de ioga da ação, do serviço ou do trabalho. Compreende que nossas vidas são determinadas por nossas ações, físicas ou mentais, que geram efeitos sobre nós mesmos e definem nossas tendências. Porém, entende que não devemos nos identificar com os méritos dos nossos atos. Propõe que devemos realizar as tarefas pelo bem da humanidade pela simples vontade de fazer o bem, e não pela expectativa de receber seus resultados.

BHAKTI IOGA
É o caminho do amor, da fé e da devoção a alguma divindade personificada, vista como a realidade suprema. Entende que as emoções devem ser canalizadas em forma de adoração a essa divindade, o que pode ser praticado de diferentes formas, como rituais, cantos, prostração diante de imagens etc. Em geral, é considerada uma doutrina dualista porque os devotos se relacionam com um deus separado, mas algumas vertentes consideram como meta a união com a divindade. É um caminho muito praticado na Índia.

RAJA IOGA
É a ioga da meditação, que se baseia no controle da mente para poder alcançar a realidade supraconsciente –além do consciente e do inconsciente. Refere-se ao sistema clássico ou ioga de Patañjali, filósofo que compilou no texto “Ioga Sutras” os estágios para se alcançar o domínio sobre a mente. Os oito passos (“ashtanga”) propõem, por exemplo, condutas como não violência (“ahimsa”) e verdade (“satya”), prática de posturas físicas (“ásanas”), direcionamento da energia vital pela respiração (“pranayama”), concentração (“dharana”), entre outros.

HATHA IOGA
Tipo de ioga que ficou mais conhecido no Ocidente, visa alcançar harmonia para o corpo físico (denso) e energético (sutil), equilibrando as energias solar (“ha”) e lunar (“tha”), por meio de práticas como posturas físicas (“ásanas”), respirações (“pranayamas”), purificações (“shatkarmas”), entre outros. É vista como complementar à raja ioga, porque além de levar a um maior conhecimento sobre si mesmo, fortalece o corpo e a mente para a meditação e para que o indivíduo tenha plenas condições de seguir no caminho de busca pela realidade.

Diferentes professores criaram metodologias próprias para a prática da hatha ioga, dando origem aos vários estilos que encontramos espalhados pelos estúdios mundo afora. Dela derivam, por exemplo, a Hatha Ioga propriamente dita, além de Iyengar, Ashtanga, Vinyasa, Sivananda, Bikram, Ioga Integral e tantas outras.

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Nem todos os gurus vestem túnicas https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/07/27/nem-todos-os-gurus-vestem-tunicas/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/07/27/nem-todos-os-gurus-vestem-tunicas/#respond Fri, 27 Jul 2018 10:09:41 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2018/07/renunciantes-em-haridwar-1-150x150.jpg https://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=209 Minha professora tem cabelo joãozinho, mas não é monja. É casada e às vezes deixa escapar um palavrãozinho de nada. Ela é jovem e bonita, vive numa cidade grande e é ativa nas redes sociais, mas acorda às 4h da madrugada para sua prática diária. Está por dentro do que acontece mundo afora, mas parece que sabe mais sobre o mundo dentro de cada um de seus alunos do que eles próprios.

Não morar em um “ashram” –mas passar algumas temporadas por lá– e não andar por aí vestida com uma túnica laranjada –mas nos dias frios usar um lindo xale indiano– não faz dela menos professora, mestre ou guru (ainda que ela fique de cabelo em pé ao ler isto).

Pelo contrário: ao viver como vivemos hoje em dia, ela me faz perceber que não precisamos fugir pra uma montanha sagrada para encontrar o que buscamos com ioga. Quer dizer, a não ser que você queira mesmo ir meditar no monte Kailash, no Tibete. Por que não?

Hoje, lua cheia do mês “ashada” no calendário hindu, é o dia em que a Índia comemora o Guru Purnima, uma homenagem aos professores, mestres e gurus. Um texto oriental, chamado de “Advayataraka Upanishad”, define o guru como aquele que tira a ignorância: “A sílaba ‘gu’ significa escuridão e a sílaba ‘ru’ significa aquele que a elimina. Devido ao poder de dissipar a escuridão, assim é chamado o guru”. O termo implica diferentes níveis de compreensão, mas uso aqui para me referir ao mestre mais próximo que nos orienta na nossa prática pessoal.

Só de pensar na possibilidade de ter um guru, alguns leitores podem virar o rosto e se contorcer em “marichyasana”, a postura do sábio Marichy (na foto acima, realizada pelo mestre B. K. S. Iyengar). Não é à toa. Nossa cultura ocidental supervaloriza o individualismo, o autodidata e a independência na busca pelo conhecimento.

Ser autodidata é mesmo uma habilidade bem útil, mas insuficiente quando o objeto em estudo somos nós mesmos, o que acontece com ioga. É preciso que exista uma relação de confiança entre o aprendiz e alguém mais experiente, como se este lhe apontasse um espelho, permitindo que o aluno descubra o conhecimento que já tem em si mesmo –que também pode ser chamado de seu mestre interior. Mas isso não significa que devemos simplesmente fechar os olhos e seguir um guru cegamente, sem questionamentos.

Gosto de um trecho do livro “O Coração do Yoga”, em que T. K. V. Desikachar explica que o guru não é alguém que tenha seguidores, mas quem lhe incentiva a descobrir seu próprio rumo: “O verdadeiro guru é o que lhe mostra o caminho. Você segue o caminho, e então vai sozinho, por sua conta […] Posso sempre agradecer meu guru naturalmente e apreciar a relação com ele, mas não preciso segui-lo, porque senão não estaria no meu próprio lugar. Seguir o caminho do guru é outra forma de perder a si próprio”.

Ou, como aprendi com minha professora: primeiro passamos por uma fase de observar, investigar e questionar os valores e comportamentos do mestre. A partir do momento em que nos sentimos seguros de que ele é coerente com os ideais em que acreditamos, a confiança se estabelece e nos abrimos para o que ele tem a nos oferecer. É aí que começa a instigante jornada da auto-investigação.

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Se não é só postura física, o que é ioga afinal? https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/06/30/se-nao-e-so-postura-fisica-o-que-e-ioga-afinal/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/06/30/se-nao-e-so-postura-fisica-o-que-e-ioga-afinal/#respond Sat, 30 Jun 2018 12:47:34 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/iogues-em-varanasi-150x150.jpg http://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=85 Você provavelmente já ouviu por aí que ioga não se resume a fazer posturas físicas em um tapetinho. Mas também já deve ter visto tantas definições diferentes, que é bem possível ficar confuso em meio a tudo isso. Então, o que é ioga afinal?

As explicações podem variar de acordo com a fonte. Para dar um panorama geral, vou me basear em dois livros que considero fundamentais para quem quiser se aprofundar no tema: “O Coração do Yoga”, de T. K. V. Desikachar, e “A Tradição do Yoga”, de Georg Feuerstein. Você vai perceber que, no fim das contas, os diferentes conceitos se complementam. Quer ver? Então me acompanhe…

Na tradição indiana, ioga é um dos seis principais “darshanas” –escolas ortodoxas ou sistemas filosóficos hindus, considerados “pontos de vista” ou perspectivas sobre a realidade –no hinduísmo, a separação entre filosofia e religião não é tão clara como no Ocidente.

Os outros cinco são “mimamsa” (análise das questões morais), “vedanta” (metafísica não-dualista, vê a realidade como um todo único), “sânquia” (estuda as categorias da existência de forma dual, com separação entre natureza e seres), “vaisheshika” (distingue as coisas por categorias da existência) e “nyaya” (estudos de lógica e retórica). Vamos nos concentrar na visão da ioga.

PERSPECTIVA DA ESPIRITUALIDADE

Se buscarmos a origem da palavra, ioga vem do sânscrito “yuj”, que significa juntar ou unir. Por isso ouvimos tanto que ioga é união. Mas união com o quê? Desikachar afirma que é com “o que quer que nos aproxime da compreensão de que há uma força superior e maior do que nós mesmos”, chame isso como quiser: realidade transcendente, força do universo, energia da natureza, Deus, Alá…

Esse estado de união, acompanhado por um êxtase que vem da compreensão máxima sobre a nossa natureza e o universo, é chamado de samádi e visto como um dos objetivos da ioga.

Também se fala de união entre corpo, mente e espírito (ou emoções). Em outras palavras, seria direcionar todos os nossos sentidos e atenção para um único foco. E o que isso significa, na prática? Significa, por exemplo, fazer uma coisa de cada vez nas nossas tarefas cotidianas ou, em uma aula de ioga, manter a atenção no corpo e na respiração, em vez de ficar pensando no que você vai fazer quando sair dali ou de viajar em outros pensamentos que não têm nada a ver com a prática.

Meditação em Varanasi
Praticantes de ioga meditam às margens do rio Ganges, em Varanasi, na Índia (Foto: Patrícia Britto)

Isso nos leva à próxima definição histórica.

No “Ioga Sutra”, texto clássico considerado um marco da ioga, o filósofo Patanjali a descreve como a “contenção das flutuações da mente”, também entendida como a habilidade de direcionar a mente, sem distração, para determinado objeto. Isso pode ser alcançado por meio de posturas físicas, direcionamento da respiração, meditação, entre outros. Ao todo, são descritos oito passos (“ashtanga”), que rendem um novo post.

Já no “Bhagavad Gita”, outro texto clássico indiano, ioga é descrita como “perícia na ação”, ou a capacidade de realizar cada ato com excelência. Mais uma vez, essa excelência na ação seria resultado de uma mente focada. Outro trecho do mesmo livro trata ioga como “equanimidade”, o que resultou nas frequentes referências a “equilíbrio” e “harmonia” do ser –também consequência daquele estado de plena consciência.

Viu como, apesar de diferentes, essas definições têm tudo a ver uma com a outra?

‘QUESTÃO PESSOAL’

Apesar de ter surgido na tradição hindu, o conteúdo da ioga é considerado universal e não é preciso seguir aquela religião, ou qualquer outra, para praticar a filosofia indiana, segundo Desikachar:

“A verdadeira prática de ioga leva cada pessoa numa direção diferente. Não é necessário concordar com uma ideia particular sobre deus para seguir o caminho da ioga. A prática de ioga só requer que ajamos e estejamos atentos às nossas ações. Cada um de nós deve ser cuidadoso com a direção que toma, para que saiba aonde vai e como vai chegar aonde quer. Essa observação cuidadosa nos tornará aptos a descobrir algo novo. Se essa descoberta nos leva a um melhor entendimento sobre deus, a um maior contentamento ou a um novo objetivo, isso é uma questão completamente pessoal.”

Lakshman Jhula em Rishikesh
Vista da ponte Lakshman Jhula, em Rishikesh, considerada a capital da ioga (Foto: Patrícia Britto)

Juntando as principais explicações, podemos entender ioga como uma disciplina ou estilo de vida que nos leva a uma maior compreensão sobre nós mesmos e o universo. E que, por meio dela, entendemos melhor nossos padrões de comportamento e podemos fazer escolhas menos influenciados por condicionamentos ou pela repetição automática de hábitos.

É por isso que dizemos que ioga é muito mais do que posturas. O que isso tem a ver com o seu tapetinho? A prática física é um dos diferentes caminhos para desenvolver o domínio sobre a mente e alcançar um conhecimento maior sobre nós mesmos. Esse entendimento pode vir, por exemplo, quando observamos nossas atitudes diante de uma postura difícil: desistimos rápido? Trabalhamos até chegar lá? Ou deixamos o ego falar mais alto e insistimos nela, mesmo que o corpo ainda não esteja pronto? E o que isso nos diz sobre nós mesmos?

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Yoga, ioga, o yoga, a ioga, o ioga… https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/06/24/yoga-ioga-o-yoga-a-ioga-o-ioga/ https://namaste.blogfolha.uol.com.br/2018/06/24/yoga-ioga-o-yoga-a-ioga-o-ioga/#respond Sun, 24 Jun 2018 14:25:20 +0000 https://namaste.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/Livro-indiano-150x150.jpg http://namaste.blogfolha.uol.com.br/?p=57 “Ioga é um estilo de vida.” “Yoga surgiu na Índia há mais de 5.000 anos.” “A ioga nos leva ao autoconhecimento.” “O yoga desenvolve o domínio sobre o corpo, a mente e as emoções.”

Ioga pra lá, yoga pra cá, e haja respiração profunda pra se entender nessa Torre de Babel. Afinal, o certo é ioga ou yoga? Feminino ou masculino? Com “o” aberto ou fechado?

Vamos começar do começo: a palavra tem origem no sânscrito, uma das línguas da Índia que é usada em um sistema de escrita diferente do nosso alfabeto latino, o chamado devanágari. Nesse sistema, ioga se escreve assim: योग.

Não ajudou muito, não é? Para que as pessoas que usam alfabetos diferentes possam se entender, existe a transliteração: uma forma de transcrever letras e fonemas de uma escrita para outra, seguindo determinadas convenções quando não existe correspondência direta (uma ferramenta de conversão pode ser encontrada neste site).

Existem várias convenções de transliteração do devanágari para o alfabeto latino. Dependendo da que for escolhida, योग vira yoga ou yōga, sempre com y. Mas aí começa a segunda parte da questão, que é a incorporação de palavras estrangeiras no português.

APORTUGUESAMENTO

Em tese, as letras k, w e y são empregadas em palavras derivadas de nomes próprios, como “kafkiano” (que vem de Kafka), “darwinismo” (derivado de Darwin) ou “taylorismo” (de Taylor).

Já os nomes comuns, em geral, sofrem o aportuguesamento, que é a adaptação à grafia e à pronúncia da língua portuguesa (embora k, w e y tenham voltado a ter uso oficial no português com o último Acordo Ortográfico). Por isso, “whisky” virou “uísque”, “shampoo” virou “xampu” e “yoga” virou “ioga” –cujo primeiro registro em português, segundo o dicionário “Houaiss”, foi em 1890.

A ortografia oficial da nossa língua está consolidada no Volp (Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa), da Academia Brasileira de Letras, e agora, mais recentemente, também no VOC (Vocabulário Ortográfico Comum), da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.

O primeiro registra apenas “ioga”, mas admite os dois gêneros (a ioga, o ioga). Já o segundo admite tanto “o yoga” (com “y” é sempre masculino) como “o/a ioga”. Aparentemente, nem os linguistas se entendem sobre isso, mas o fato é que as duas formas são consideradas corretas.

Uma das possibilidades é que a grafia “yoga” tenha sido admitida devido à alta frequência de uso no Brasil. Afinal, a língua é dinâmica e reflete os costumes de seus falantes.

Bem, pelo menos um consenso existe: nem ioga nem yoga levam acento, por causa das nossas regras de acentuação gráfica. Ufa! Moral da história? Tanto “o yoga” (com “o” fechado) como “o/a ioga” (com “o” fechado ou aberto) são admitidos na língua portuguesa.

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